sexta-feira, 26 de abril de 2013

Cinquenta tons de cinza

"Vai de metrô até o Brás, pega o trem sentido Estudantes e desce em Ferraz. Até a escola dá 1km e pouco, uns 20 minutos de caminhada".

Trem sentido Estudantes = igual a embarcar no de Guianases, baldear e pegar o que vai pra Estudantes. Mas isso só se desobre perguntando, porque a sinalização da CPTM no Brás continua ruim :o/

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Íamos andando até a escola (eu e um amigo fotógrafo), mas estávamos de pé há horas com sacolas pesadas, então resolvemos pegar um táxi. Que não reconheceu a rua pelo nome, mas quando a gente disse que era "no São João, uma escola de estado", ele nem perguntou mais nada, "sei".

Tomara soubesse mesmo. Até porque, se dependesse de mim para informar o nome da escola, esquece.

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"Não tô sequestrando vocês não", brincou, enquanto se enfiava em uma quebrada escura, pouco habitada, mato alto. Mas ali, no meio do mato, no alto do morro, estava a escola. Uma senhora muito expansiva e sorridente, com jeitão de gente finíssima (e no fim era mesmo) gritou para dentro do carro "é aqui mesmo".

Desci; ela ralhava em tom de gozação com um rapaz alto, com ar malandro mas mais atrapalhado que agressivo: "Jogou o cigarro no chão, Gabriel? Pô, Gabriel". Depois descobri que ela é a diretora. 

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Escola de estado tem tudo aquela mesma cara... A cor das paredes, o piso, as dimensões do pátio, as escadas. Mas essa é bem ajeitadinha. Limpa (diz que depois da saída do turno está suja de novo, mas é assim também na PUC...). Portas, janelas, latas de lixo, sala dos professores, murais... Tudo bem cuidado.

Gostei da diretora, dos professores, dos funcionários. Simpáticos, animados, "descolados". E compreensivos. O portão não fecha rigorosamente às 19h00, porque eles sabem que é difícil chegar ali, principalmente para quem trabalha.

Mesmo assim... Depois de fechados os portões, muitos alunos pulam o muro... pra sair. E é alto.

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A quebrada é feia mesmo. A escola tem um acordo com os bandidos: "da esquina pra lá", eles fazem "o deles". "Da esquina pra cá", não. É espaço da escola.

Eles respeitam.

Mesmo assim, na saída do "merendeiro" (geralmente é mulher, né?) na segunda à noite, mal ele botou o nariz pra fora do portão, encostaram dois garotos armados e levaram a moto. A polícia apareceu rápido e recuperou. O mais triste: "Eram ex-alunos. Com certeza tinham comido do que ele preparou. O que dá nessses moleques?". E fica a dúvida de por que eles não respeitaram o acordo e se serão punidos pelo tráfico.

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A Secretaria de Cultura está organizando um festival com eliminatórias e tudo entre as escolas da cidade. Os alunos estão exultantes. A diretora, compreensiva mais uma vez, autorizou os meninos a sair de alguma aula, se o professor permitir, para ensaiar. "Não tem a menor chance de eles conseguirem se encontrar fora daqui".

Eu lembro quando a gente era liberada, no Colégio, para ensaiar, treinar, passar nas classes dando recado... Ô delícia.

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O prefeito foi lá e falou sobre o estado lastimável em que encontrou a cidade. MUITA conta sem pagar, muita corrupção, prefeitura destruída. Foi lá o "dedo de silicone", lembra? Pois é, dá pra dar uma ideia... A diretora não se surpreendeu nem um pouco. Moradora antiga da cidade, filha do primeiro prefeito que Ferraz teve (foi emancipada não faz muito tempo), comentou enquanto tomávamos suco depois da minha palestra: "A gente sempre dizia "coitado do prefeito que entrar agora"."

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"O Laudo Natal era o governador. Ele asfaltou muitas ruas e mandava os paralelepípedos pra cá. Foi assim que foi feito o primeiro calçamento aqui, quando meu pai era prefeito".

 Não acreditei! Quando fazem capeamento e recapeamento jogando asfalto por cima dos paralelepípedos - isto é, SEMPRE - fico indignada. Que desperdício!! Uma vez, quando era Subprefeita, perguntei se não tinha jeito de primeiro retirá-los, depois fazer o contrapiso e finalmente a "cobertura asfáltica". Riram da minha cara.

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Contei para o Sergio Avelleda, ex-presidente da CPTM, que fui falando bem do trabalho dele no caminho. Em pouco tempo (uma gestão), aquela linha que corta a ZL melhorou muito. Era horrível. O Portela (ex-Secretário de Negócios Metropolitanos) falou no dia em que foi empossado: "Linha F é nossa prioridade. Mandei todo mundo que vai trabalhar comigo dar uma volta nela pra ver como ela está horrível). Chamei a atenção do meu amigo fotógrafo, carioca que mora há 15 anos em São Paulo, para os trens novos, os reformados, as estações idem... Os bicicletários, os muros derrubados... Falei que o presidente pegava o trem regularmente e que isso faz muita diferença...

Pensa que o Avelleda ficou envaidecido com os elogios? Como bom fanático pelo que faz, inevitalmente frustrado, respondeu um pouco trsite: "Putz, aquela estação de Ferraz já era pra estar pronta".

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Enquanto estávamos na sala dos professores, um menino entrou procurando revistas para fazer uma atividade em sala de aula. Não tinha nenhuma.

Eu guardo tanta, mas tanta revista para alguém usar em sala de aula... Minha mãe sempre fazia isso; sempre tinha que recortar umas fotos, colar no caderno, fazer um cartaz... Com "cartolina branca, cola branca lavável, canetinha hidrocor". Já não tenho criança em casa, vou ver se mando umas pilhas pra lá.


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A sala estava cheia de cartazes da Apeoesp, convocando para a manifestação de hoje na Paulista, xingando o governo de tudo quanto é nome. Sem que eu perguntasse, a diretora disse "eles vieram aí, pediram para colocar, claro que eu deixo". A professora que era minha anfitriã, que foi quem inventou de me levar lá, disse "Tem coisa que eles tem razão. Eu sou classe O. Tinha cinco quinquenios pra receber. Veio o senhor Serra e o senhor Paulo Renato e cortaram tudo. Não respeitaram direito adquirido! Eu encontrei o Serra uma vez em um evento quando ele ainda ia ser candidato a deputado. Ele me deu um quadro do Chaplin. Fiquei com tanta raiva dele que taquei fogo no quadro. E eu amo o Chaplin".

Ele tem um "certo" talento para exagerar na dose da austeridade... É f. Corta privilégios, bota ordem em algumas zonas mas no caminho atropela um monte de gente boa :o/

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Perguntei para os meninos do Ensino Médio no auditório improvisado (eles desceram com as cadeiras da sala de aula) quantos já sabiam o que queriam fazer depois da faculdade. Uns 80% levantaram a mão. Fui tentando adivinhar os cursos: Direito, Medicina, Nutrição, Psicologia, Engenharia, Rádio e TV, Gastronomia... Tinha mão levantada para todos eles.


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No caminho da Câmara para o Metrô (fui pra Ferraz depois da reunião da CCJ na quarta-feira), encontrei um líder muito bacana lá de São Miguel. Ele foi o responsável pela reforma (ressurreição...) do Mercado de lá, que estava um lixo. "Sabe quando você faz uma licitação? As pessoas se inscrevem, né? Lá não. A gente pra licitar os boxes tinha de ir atrás laçando interessado. Nem meu irmão quis entrar. Hoje, vai ver quanto vale um ponto daquele. Agora meu irmão brinca que ele devia ter entrado. Olha, ainda bem que não entrou, senão já iam falar que tinha coisa". Gente boa demais, verdadeiramente preocupado com o seu pedaço de mundo. "Vão inaugurar a estação nova em um lugar muito bom. Mas o comércio que ficava no caminho da estação velha vai ficar largado! A gente tem de pensar em alguma coisa para aquele pessoal ali!".

Conta que ajudou muito um vereador que hoje é Secretário. "Arrumei muito voto pra ele ali. Depois comecei a ver como é que ele trabalha... Não quero mais saber dele não". Eita nóis.

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Na volta, peguei um táxi na Luz e o motorista me reconheceu. Gosta muito de mim. Odeia o Serra. Foi exonerado da Febem depois de ser acusado de tudo de ruim - agressão, tortura. "Foi pessoal. Me pegaram pra Cristo. Absurdo, um processo que levaria pelo menos dois anos foi concluído em quatro meses. Coisa da Berenice, que está lá até hoje. Agora tô aqui, atrás do volante".

Não tem tanto bode do Alckmin. Diz que "hoje em dia, não tem mais esquerda, nem direita. O que tem é situação e oposição". Tem medo dessa "aproximação do PT e do PSDB".  Eu disse "não se preocupe, ano que vem eles vão estar um contra o outro tentando se matar".

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Simples o mundo, né? Preto e branco.

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