Vale a pena ler a transcrição da sessão em que Jaqueline
Roriz foi cassada [Anotação de 31/05/2012: ela NÃO foi cassada, né? Olha o ato falho. Aff. Eu cassei...]
Em alguns momentos, é uma demonstração da política mais
elevada, em que se deixam de lado picuinhas marqueteiras (ai, como tem...) e se fala sério. PSOL, PSDB, PPS, PV e DEM estavam do mesmo lado, com seus líderes se
pronunciando pela cassação da deputada, por ofensa ao decoro do PARLAMENTO. E
assumindo a defesa do fim do voto secreto (como outros parlamentares já o
fizeram em outra ocasião e agora... desencanaram).
¹
O voto secreto foi criado por uma boa razão – para garantir
que parlamentares pudessem votar sem qualquer pressão em matérias como essa,
naturalmente desagradável: a cassação de um colega. Imaginem em outro ambiente
de trabalho: alguém que trabalha com você há anos é acusado de algo. Você e os demais tem de dizer, na frente de
todo mundo: “eu sou a favor que ele seja demitido”. Claro, é o certo – mas
falar é fácil... Deputados não são super-pessoas, são seres humanos (juro!)
como nós.
A Câmara Municipal de São Paulo, sob a presidência de José
Eduardo Cardozo, aboliu o voto secreto. Existe, se não me engano, a
possibilidade de sessão secreta – mas no plenário, o voto é sempre aberto. O
resultado disso é interessante...
Quando a Casa quer diluir a responsabilidade por alguma
votação “esquisita”, o voto é simbólico. O presidente da Sessão diz: “Os que
estiverem favoráveis, permaneçam como estão”. Depois de um milissegundo, ele
diz “Aprovado”. Pronto. Não precisa ter mais de meia dúzia de vereadores em
plenário... Basta que, na abertura da sessão, tenha havido quórum.
Se isso é raro? Que nada! Raro é o contrário: votação
nominal. Que acontece, em alguns casos, por exigência da própria legislação; em
outros, como recurso para obrigar os parlamentares a se expor ou para tentar
barrar um “rolo compressor” do governo, por exemplo.
A eleição para a Mesa Diretora e Corregedor da Casa é
nominal. Mais que isso – os parlamentares não votam no Painel, todos ao mesmo tempo; vão ao microfone, um a um, anunciar seu voto, porque é um nome, não um “sim”
ou “não”.
Desde a primeira eleição, eu pensava “ah, se o voto fosse
secreto”... Porque eu tinha vergonha de decisões da minha bancada. Não queria
votar como meus colegas, mas o partido tinha fechado questão. Fui
votando e tapando o nariz, com cãibras no estômago, até que uma hora não agüentei
mais. Avisei a chefe de gabinete na Bancada: “NÃO POSSO votar em Agnaldo Timóteo
para a Mesa Diretora”. Precisei tomar coragem. Precisei ser veemente na
explicação – como se o mandato não me pertencesse nem um pouco! “Ele se elegeu
com patrocínio da CBF. Ele defende o contrário de quase tudo que eu defendo.
Ele é malufista. Ele nem conhece a cidade direito. EU VOU DIZER O QUE PARA OS
MEUS ELEITORES?”.
A orientação foi surpreendente – depois descobri que não era
nada muito incomum: “Então sai. Vai no banheiro, deixa eles chamarem
teu nome e não aparece”.
No fim, a Sessão cairia por falta de quórum sem o meu voto,
então ela foi me chamar no banheiro (olha que coisa ridícula, que constrangimento) e explicou que eu tinha de votar de
qualquer jeito, senão a eleição da Mesa ficaria pela metade. “Mas eu não posso
ser obrigada a votar nele!”. “Então você se abstém”.
Saímos do banheiro. O plenário parado me esperando voltar.
Chegou a minha vez, fui para o microfone. Quatro ou cinco vereadores me
cercaram, irritados e insistentes: “Vota nele! Segue a tua bancada! Por que
você vai fazer isso? Ele vai se eleger de qualquer jeito. Não faz isso!”.
A intimidação chega a ser física. Eles fizeram um círculo em
volta de mim. Se eu fosse homem, se eu fosse de outro partido, se eu fosse mais
antiga na Casa, ia acontecer o que às vezes acontece: “vias de fato”.
Eu declarei minha abstenção – como não havia outro candidato, era a única
alternativa.
Eleita a Mesa, vinha a eleição para Corregedor da Casa. O
candidato era Wadih Mutran, também do PP. Como já tinha passado pelo batizado
de fogo, nem titubeei: “não voto nele”. Resignada, a chefe de gabinete da
bancada nem argumentou. Paulo Teixeira, então meu colega (e alguém com quem eu
ainda me dou muito bem, apesar das imensas divergências), disse: “Eu também não
vou votar”. Um outro vereador – de quem eu também gosto, acredita?! – virou para
trás e disse, firme: “Não inventa. Você não é a Soninha”.
Era como dizer “ela é café-com-leite, é nova na política, é “artista”,
não é um de nós”. Pra mim, foi um elogio e não uma desqualificação. [31/05/12: não porque eu prefira ser "artista" do que "política". Aliás, larguei de uma coisa (trabalhar em TV) para ficar só com a outra]
Ao longo do mandato, a coisa só piorou. Depois que eu saí do PT,
então... Antes, colegas me defendiam por mero dever institucional, sem a menor
convicção e empenho. Era comum “irem ao banheiro” quando outros tentavam me mandar para a Corregedoria, por
exemplo, por eu ter dito em uma entrevista que havia corrupção na Câmara
Municipal. Não todos – sempre houve os que ficaram lá, com ou sem convicção, e
fizeram seu papel de colegas pra valer, discursando em minha defesa.
Em outras eleições da Mesa, só eu, em toda a Câmara, votei contra o candidato a
presidente, Antonio Carlos Rodrigues, do PR, hoje Suplente da Marta no Senado.
Quem não queria votar nele de jeito nenhum – umas duas ou três pessoas –
faltava à Sessão. Assessores meus, preocupados de verdade comigo, diziam para eu fazer a
mesma coisa. Só faltava implorar: “Por favor, não vá. Basta não aparecer, você
não vota nele e não se expõe”.
De novo, como é que eu ia explicar para meus eleitores – e para
o espelho, fazendo a barba rs – que eu tinha faltado a uma das sessões mais
importantes da Legislatura???
Fui, declarei meu voto contrário e justifiquei –em termos
civilizados e brandos. Mas fui retaliada até o fim do mandato. “Projeto dela?
Está suspensa a sessão. Ou tira da pauta ou não se vota mais nada” – essa foi
uma cena que se repetiu várias vezes. Jornalistas assistiam a isso tudo na
tribuna, achavam bizarro, balançavam a cabeça, brincavam comigo: “O presidente
te adora, hein?”. Mas acho que, com exceção de um jornalista do Estadão
(caramba, como é o nome dele?) [31/05/2012, lembrei: Diego Zancheta] , ninguém publicava uma linha.
Tudo isso para dizer que o voto secreto tem, sim, uma razão
de ser. É uma proteção ao parlamentar. Nesses rincões do Brasil, pode proteger
até sua vida – se em São Paulo vereadores apanham por discordar de algumas
coisas... (Não é modo de dizer. Não aconteceu comigo, mas com colegas na
Legislatura anterior).
Mas como foi completamente deturpado, tem de cair. É a
opinião, também, da Erundina (PSB), e de alguns deputados do PT que se
pronunciaram no plenário – pela cassação de Jaqueline Roriz e pelo fim do voto
secreto. Mas os líderes deses partidos não se pronunciaram... E em entrevista no dia seguinte, Candido
Vaccarezza (PT, líder do governo) disse que NÃO é a favor do fim do voto secreto.
***
Acabei não falando quase nada da sessão em si. Como disse,
vale a pena ler a transcrição. Tem momentos nobres, de alinhamento
verdadeiro de parlamentares sérios de partidos diferentes. E tem um pouco do ridículo das
sessões plenárias, com intervenções nada-a-ver no meio de uma discussão muito
grave.
A gente devia ler transcrição do plenário todo dia, isso
sim.
¹Queria procurar no site o resultado da votação do projeto
que abolia o voto secreto na Câmara, para ver quem votou a favor e hoje
capitula, mas não vou ter tempo. Alguém se habilita?
Soninha, pelo o que eu li e entendi, a votação foi feita em primeiro turno. Acho que o link abaixo te ajuda.
ResponderExcluirhttp://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=28376
As regras não devem ser feitas de modo a preservar o parlamentar às custas do eleitor.
ResponderExcluirSe por um lado o voto secreto protege o (suposto bom) parlamentar de retaliação dos colegas, protege também o mau parlamentar dos olhos da população.
Leandro:
ResponderExcluirIsso mesmo, foi votado em primeira, e aqui tem a votação:
http://www2.camara.gov.br/atividade-legislativa/plenario/chamadaExterna.html?link=http://www.camara.gov.br/internet/votacao/mostraVotacao.asp?ideVotacao=2605&tipo=partido
Valeu!!!
Oi, tenho uma -simpatia- pelos seus discursos em relaç a alg coisas. Qto ao voto secreto é bem vinda a famigerada frase/pimenta nos olh dos outross é refresco!/Qdo p.explo. A União faz a Força, tb nos convém. Arrisc até a própria Vida num momento de diz Yes or No ou os Nomes de certos indivíduos q ñ ~s dignos de eleitor algum... Aproveito p te pergt sobre a Educação (Escola Regular e o Projeto MOVA - Prof Paulo Freire- e outros possív projetos que envolv MELHORIAS para Educação como um todo) Obrigada Marilia (Mariliaar_12@hotmail.com). Abraço SORTE
ResponderExcluirABENÇOADA DE DEUS PAI/FILHO e ESP SANTO! AMÉM!