sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Injustiça

Em tudo, forma e conteúdo, eu discordo do pedido de afastamento do Sérgio Avelleda, presidente do metrô, por causa de supostas irregularidades na licitação das obras da Linha 5.

Na forma, pra começar - mesmo pra quem desconhece ou discorda da minha avaliação de mérito - porque o Avelleda não tem a responsabilidade da decisão de não suspender a licitação. Ele se manifestou a respeito e sua opinião foi acatada, mas a decisão foi tomada um ou dois degraus acima.

E eu concordo com ela.

Queria muito ter tempo para ir atrás de todos os links - o edital, atas de reunião o diabo - para preencher este post com as informações necessárias, mas como não tenho (tempo) e não terei tão cedo, quero registrar já meu protesto.

Vou tentar resumir o caso: reportagem da Folha afirmou, em outubro do ano passado, que a licitação, cujo resultado foi decidido no final de setembro, estava viciada. Para comprovar o vício, divulgou um vídeo gravado em abril antecipando o resultado da licitação.

Denúncias assim já foram feitas antes sobre mil licitações. Algumas procediam, outras não.

Quais são os vícios possíveis?

1) Resultado arranjado entre o governo e os vencedores, que pode ser de dois tipos - o próprio edital já é feito de uma maneira a excluir concorrentes (como o famoso caso da massa de tomate com ervilha) ou há uma combinação quanto aos valores a serem apresentados. O tipo clássico de combinação: joga-se o preço lá embaixo de modo a ganhar a concorrência, mas já fica acertado que, lá na frente, o governo faz aditamentos de contrato permitindo que o pagamento seja maior do que o previsto inicialmente. Capice? "Vai lá e diz que você faz o serviço por 50 mangos. Ninguém vai oferecer tão pouco porque não são nem loucos, custa muito mais do que isso. Aí você pega o serviço e depois a gente arruma os outros 100 que ficariam faltando - e você deixa 20 com a gente, falou?".

2) Com conhecimento do governo ou não, aparecem uns concorrentes "meia boca", laranjas, que fingem que participam da disputa mas é só para deixar uma outra empresa ganhar.

3) No caso de uma licitação como essa do metrô, em que eram disputados 5 lotes de obras, as empresas podem fazer o seguinte: elas se reúnem e combinam quanto vão pedir por lote de modo que cada uma ganhe um deles. "Eu peço 100 no primeiro e 180 nos outros quatro; você faz o mesmo em relação ao segundo, o outro faz isso no terceiro...". Ou seja: é desleal com a concorrência. Com as empresas que não entraram nesse acordo. Mas, a menos que as empresas "combinadas" não tenham competência para executar a obra ou estabeleçam preço muito abaixo ou muito acima do razoável, o contratante - a administração pública - não tem como nem por quê ser responsabilizada por essa combinação. O que ela poderia fazer, dizer para as empresas: "Ah, para, to achando que vocês combinaram..."? Como saber, como provar?

Sério. O que o metrô poderia fazer? O que DEVERIA fazer?

Bom, o que a Folha afirmava era que tinha havido desonestidade - sem especificar qual ou de quem. "Nós já sabíamos o resultado antes, portanto a licitação foi viciada". É direito da Folha se gabar de "saber antes" e de lançar a suspeita. É dever de todo mundo investigar. Até porque o fornecedor da informação pode ser alguém que na verdade queria mesmo atrapalhar o processo todo por razões não recomendáveis.

Uma das acusações - ou a acusação mais séria - da Folha era de que, por causa do vício no processo, o metrô gastaria milhões de reais a mais. O metrô nega e diz que, pelas regras do Edital (tornado público muito antes, como tem de ser), avaliado e reavaliado (até porque havia sido questionado por algumas empreiteiras), a hipótese levantada pela Folha - de que era possível escolher um orçamento mais barato - não existia de verdade.

E não foi encontrada nenhuma comprovação de que a concorrência tinha sido viciada nem encontrei alguém, além dos promotores do MP, que afirme, demonstre e comprove que a obra vai sair mais cara do que poderia/deveria.

Se ficar provado, retiro tudo o que eu disse aqui e peço cadeia para os envolvidos.

MAS, por enquanto, o que se pede é um absurdo: "Parem tudo, suspendam, comecem tudo de novo".

Absurdo.

Tem gente querendo cancelar licitação o tempo todo, especialmente por se sentir prejudicado no processo. Digamos que 40% das queixas sejam legítimas, quer sejam consideradas, no final, corretas ou incorretas. O cara recorre porque realmente se sentiu prejudicado. Mas uns 60% são de gente que quer MELAR. Que quer virar a mesa. Que não ganhou honestamente mas vai tentar ganhar no tapetão. Que usa esse mecanismo de obstrução para chantagear: "Ou vocês acertam alguma coisa comigo, ou essa merda não vai sair do lugar".

O fato é que, antes de cancelar um processo tão grande, tão demorado, tão custoso, cujo adiamento significa tanto prejuízo para a sociedade e os contribuintes, é preciso ter muita segurança de que houve mesmo ilicitude.

Com mil perdões pela comparação com algo tão menor: quando resolveram anular o resultado de TODAS as partidas apitadas pelo Edilson Pereira de Carvalho, porque "se ele fraudou um jogo pode ter fraudado todos", eu achei um absurdo. Anular e refazer um jogo é pena capital, não pode ser decretada porque "é bem provável que".

Fiquei quase sozinha entre meus colegas de mídia esportiva... Tinha um que concordava, mas já não me lembro qual :o(

Enfim, pediram para o metrô cancelar tudo e fazer outra concorrência. O governo de São Paulo estudou, avaliou, quebrou a cabeça e concluiu: "Não tem que cancelar".

O MP discordou e agora pede a cabeça do Avelleda por não ter cancelado.

Eu acho um absurdo. Absurdo.

E cazzo, alguém pode fazer o favor de LER mesmo o Edital e ver se o que o metrô alega é verdade ou mentira? Não era isso que tinha de ser feito, em vez de ficar com declaração pra cá e declaração pra lá?

***
Seguem links para dois comunicados do metrô:

- Metrô esclarece manifestação do Ministério Público
- A propósito da decisão da Justiça, Secretaria dos Transportes Metropolitanos esclarece

Lamento muito, muitíssimo, pelo Avelleda. Os filhos dele sofrem na escola com insultos dos colegas. Justo um dos caras mais completamente íntegros que eu já conheci não só na administração pública, mas na vida.

Um comentário:

  1. Soninha, eu não sei se faz sentido, mas quando a Folha diz que sabia o resultado da licitação, dos vencedores, afinal, quantos eram os licitantes? Pois dependendo do número, é fácil fazer uma combinação, gravar vídeos para todos, registrar tudo em cartório e depois dizer "eu sabia"...

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