domingo, 4 de dezembro de 2011

Uma Copa é uma Copa, outra coisa é outra coisa

Esse texto da Raquel Vedenacci, coordenadora da secretaria executiva do Comitê Paulista de preparação para a Copa 2014, é muito perspicaz e esclarecedor. Que bom que tem alguém envolvido tão diretamente com o evento e com tamanha lucidez. [Grifos meus]

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A Copa sobre trilhos

Muita gente espera uma revolução urbanística em razão da Copa do Mundo. Espera que problemas históricos sejam resolvidos e que a cidade no dia seguinte do evento seja um lugar muito melhor para se viver. Mas não é raro que esse mesmo grupo de pessoas, ao ser questionado sobre um bom exemplo dessa “revolução”, cite o caso clássico de Barcelona ou o que se vê agora em Londres. Ou seja, para exemplificar a transformação esperada para a Copa... usam modelos olímpicos...

Não se trata de contrariar qualquer desejo ou iniciativa para termos uma cidade melhor, mas também é importante olhar para a Copa do Mundo sem paixão e enxergá-la como é: um megaevento esportivo, privado, capaz de promover mundialmente o local onde é realizado, cuja responsabilidade governamental é compatibilizar suas demandas com o dia a dia da cidade, garantindo basicamente mobilidade, segurança e atendimento médico (depois de solucionada, é claro, a questão do estádio). Só as linhas de trem que passam em frente ao estádio transportam, diariamente, mais de 1 milhão de pessoas. Na Copa, serão cerca de 50 mil torcedores, em operação especial.

O ponto em questão é que não há um “manual” para as demandas e/ou oportunidades governamentais. A FIFA detalha minuciosamente o que espera de um estádio da Copa, palco do seu evento. Da cidade, não só a FIFA e o COL, mas a população também espera que o governo saiba o que deve ser feito.  E talvez seja aí que a confusão comece: são 12 sedes e pelo menos 12 realidades, necessidades, estratégias, expectativas e condições financeiras completamente diferentes.

No caso de São Paulo, não há dúvida que a cidade é maior que a Copa. As demandas diárias da cidade, da população são muito superiores às do evento. Os desafios cotidianos de transporte, segurança e outros serviços priorizam investimentos públicos constantes, e não só porque a Copa vem aí.

A Copa tem um papel estratégico, é verdade, de alavancar investimentos e acelerar melhorias urbanas. Mas se São Paulo já não tivesse o Plano de Expansão do Metrô e CPTM, por exemplo, a operação de acesso ao estádio de Itaquera durante o evento impactaria muito mais a população e provavelmente não daria tempo de tomar qualquer providência efetiva a respeito, afinal, não se compram trens e revitalizam sistemas e estações em menos de 3 anos (e para quem não se lembra, o estádio indicado por São Paulo foi vetado pelo COL em julho do ano passado).

Ainda assim, com o transporte de alta capacidade garantido, hoje, pelo sistema sobre trilhos (mais de 100 mil passageiros hora/sentido), Estado e Prefeitura vão investir na melhoria do sistema viário da região de Itaquera, que vai ajudar na operação, mas será mais importante ainda como legado. Será um avanço importante num processo iniciado há anos para garantir mais emprego e qualificação profissional para a zona leste da capital. E vários outros projetos e ações nas áreas de gestão de eventos, promoção e serviço ao turista, segurança, acessibilidade, saúde e entretenimento serão colocados em prática a partir do ano que vem.

Tudo isso, enfim, é para defender a tese que a Copa em São Paulo é muito mais OPERAÇÃO do que obra, graças à infraestrutura existente. Não foi tão diferente em Berlim, que encerrou a Copa da Alemanha em 2006 – considerada um case de sucesso de organização. O desafio aqui é operacional. O desafio é não subestimarmos o evento porque São Paulo recebe 6.000 eventos por ano, porque reúne 1.. 2...3 milhões de pessoas num só evento ou porque a logística de transporte durante a Formula 1 é reconhecida como eficiente.

Cada evento é único. Tem características próprias e demandas específicas que definem sua complexidade de operação. São Paulo está elaborando sua estratégia para entrar em campo, elaborando os planos operacionais de forma integrada e olhando para o futuro, já que a Copa deve ser encarada como meio, e não como fim dos objetivos de desenvolvimento da cidade.

Raquel Verdenacci, jornalista, coordenadora da secretaria executiva do Comitê Paulista; trabalhando nesse projeto desde a escolha do Brasil como sede da Copa2014.

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