domingo, 1 de julho de 2012

Tombar para não cair

Cultura é assunto em geral tratado como "secundário" nas discussões sobre políticas públicas/compromissos de campanha/programas de governo. Em primeiro lugar aparecem - não por acaso, claro - os "clássicos" Saúde, Educação, Segurança.

Nesta campanha eleitoral em São Paulo, os temas "mobilidade urbana" e "repovoamento do centro/desenvolvimento econômico da periferia" estão tendo mais destaque do que em outros anos, aparecendo muitas vezes nas entrevistas e palestras dos outros candidatos a prefeito. Legal, porque são temas decisivos para o sucesso das outras políticas públicas. Tenho uma dorzinha-de-cotovelo ("EU JÁ FALAVA MUITO DISSO NA CÂMARA E NA CAMPANHA DE 2008!"), mas fazer o quê, não se pode reivindicar a patente de ideias que nem minhas eram. Hmpf.

Mas voltemos à política cultural - ela acaba aparecendo, junto com o esporte, quando falamos em juventude e uso de drogas, por exemplo. De uma maneira que nem sempre combina com o que eu penso sobre o assunto... É comum as pessoas dizerem "temos que dar esporte e cultura para os jovens para tirá-los da droga e do crime". 

Minhas objeções: 1) Esporte e cultura não são vacinas contra drogas e violência. Nos campos de várzea que sobraram pela cidade, tem cerveja, maconha... Se for à noite, capaz de ter cocaína... E às vezes, pela maldita omissão do poder público, tem o crime organizado patrocinando campeonatos, vereadores comprando voto com um dinheirinho para o churrasco... 2) Os jovens não são assolados/tentados a mergulhar em drogas e violência simplesmente por falta de uma bola ou um violino. 3) Cultura e esporte/atividade física são necessidade e direito de todos os seres humanos, não só dos jovens, e a possibilidade de desfrutar deles tem de ser garantida pelo poder público. 4) A gente não "dá" esporte e muito menos cultura. A gente cria espaços para que ela seja preservada, produzida, cultivada, compartilhada, difundida. 

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Independentemente das razões invocadas ao se falar em política pública de cultura (vamos deixar o esporte um pouco de lado agora), as políticas em si costumam ser do tipo "acesso ao consumo", isto é: oferecer a possibilidade de assistir a uma apresentação musical, peça de teatro, filme, espetáculo de dança. O que é ótimo! Mas não é só isso. 

As pessoas não querem só ver -  e, depois de ver, mais ainda, vão querer FAZER. Música, dança, poesia, teatro, vídeos, filmes, livros, pinturas, esculturas, fotografias etc. Precisamos criar espaços públicos em que isso também seja possível. Já fui de um grupo de teatro amador e sei que o mais difícil não é conseguir um palco para se apresentar (embora seja bem difícil atrair público para sua apresentação, o que é outro problema :o( ) - difícil é onde ENSAIAR. O mesmo vale para uma banda, um grupo de dança.

Tenho o maior orgulho de ter me lembrado disso quando era vereadora e a prefeitura convidou para os primeiros encontros que começariam a definir o destino do antigo "esqueleto do Jânio", construção abandonada pela metade na Cachoeirinha desde que ele foi prefeito de São Paulo. Entre uma sugestão e outra, disse: "Seria bom ter lugar para as pessoas se reunirem, para gravar um áudio, editar um vídeo". Hoje o Centro Cultural de Juventude Ruth Cardoso (ou CCJ, como ficou conhecido desde a inauguração), tem espaços para isso. Bem equipados e muito disputados. 

E, como mencionei de passagem, não adianta compor, gravar, editar, escrever, ensaiar e encenar se não tiver quem veja... Então uma coisa completa a outra: políticas de formação de público instigam as pessoas a se envolver e produzir, isso lhes dá mais estímulo para ver, isso aumenta as chances de todas serem vistas e ouvidas... #Círculovirtuoso :o)

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Quando lembram da Cultura, também se fala bastante em museu. Ótimo. Há cada vez mais espaços belos, atraentes, fascinantes. A molecada adora fazer "excursão" com a escola e passear por eles. Desnecessário se estender muito falando da importância que tem para ampliação de horizontes, enriquecimento da experiência de vida, reconhecimento de diferenças e identidades etc. Claro que museus precisam ser divulgados e aproveitados. 

É claro também que o patrimônio cultural não está apenas nos museus. E não inclui apenas edificações com séculos de idade e obras de arte - uma vila operária do começo do século XX faz parte de nossa história e nossa cultura; os casarões da Paulista também fazem... Faziam :o(

Hj o   me perguntou no Twitter (e já não é a primeira vez): "Quando veremos suas propostas a respeito do patrimônio histórico de São Paulo?". Pois é, entre vários outros assuntos sobre os quais já refleti 400 horas e esmiucei em propostas, não falei quase nada sobre isso.  

Fui buscar no Programa de Governo de 2008 a referência ao tema. Aqui está - na página 53, pra quem for lá procurar: 

Ressalte-sepofimnecessidaddapoià identificaçãocatalogaçãodivulgaçãdemaicuidadonecessárioà valorizaçãpreservaçãdpatrimônicultural, materiaimateriadCidade
-Investiepólocorredoredcultureváriolugaredcidadecocriaçãdlinhadtransportinterligandequipamentoculturais
-PreservaratualizarampliadivulgadocumentaçãoacervoquconstituepatrimôniculturadMunicípio.
-GarantiautonomidCONPRESPcoamplrepresentaçãdsociedadcivil,seinterferência  dCâmarMunicipaesugestão.

É uma pincelada, admito. Posso e preciso pensar um pouco mais.

- Sobre a autonomia do Conpresp: quando era vereadora, passamos pela discussão de um projeto de lei absurdo que mudava a composição e o regimento do Conselho, por isso esse compromisso.

- O segundo item é o que merece ser expandido. O patrimônio histórico, cultural, ambiental do município precisa ser: identificado; tombado; preservado; divulgado e promovido. Identificado: há muitas solicitações de tombamento equivocados. Para evitar a verticalização desorganizada da Vila Romana, por exemplo, alguns grupos reivindicam o tombamento de todo o bairro. Claro que isso não vai acontecer e não é a medida correta: trata-se de um problema a ser resolvido com zoneamento e gabaritos... Por outro lado, decerto há inúmeros bens pelos quais ninguém ainda está zelando. A prefeitura pode contratar pesquisadores que se encarreguem de fazer o mapeamento e identificação desses bens, em suas diversas características. 

O tombamento não pode ser apenas um decreto que, na prática, mais ameace do que proteja o patrimônio. É preciso dispor de recursos para garantir a restauração, quando for o caso, e sua preservação. A relação de bens tombados deve ser facilmente acessível e rica em informações. Com os recursos de TICs (Tecnologias da Informação e Comunicação), é possível fazer um trabalho maravilhoso, enriquecido com áudio e vídeo. A identificação dos bens in loco também é muito importante - e não seria má ideia acrescentar um QRCode que remetesse para o site com as informações mais detalhadas. Mais do que isso, que dependeria do interesse das pessoas, é preciso chamar atenção para o patrimônio, com eventos, roteiros turísticos promovidos e estratégias permanentes de comunicação em várias mídias (rádio, TV, impressos, cinema, banners na internet, mídia indoor, cartões postais, selos postais etc).

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Isso é tudo o que me ocorre dizer sobre o assunto agora. Agora é com você, Douglas: não poupe críticas e sugestões.

:)

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