sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Mais Médicos - 3

Um texto muito bom no Facebook - do Padre Genivaldo Ubinge, que nos recebeu (eu e minha amiga Francyene, que já havia passado um tempo lá fazendo atividades em presídios, aldeias e igrejas) em Guajará-Mirim. Discordo de um ponto ou outro - como quando ele afirma (porque certamente acredita) "é claro que o programa Mais Médicos prevê investimentos em infraestrutura, equipamentos, abertura de novas vagas e especializações". Não... Não é claro. Veremos se esses investimentos estão realmente previstos e PRINICIPALMENTE se vão acontecer.

Mas as ponderações são tantas e tão sensatas, honestas e justas que tenho vontade de assinalar várias delas com vermelho em negrito rs. Só não o faço porque a leitura acaba ficando mais cansativa... A elas então:




Reflexões de um homem (um religioso, se é que vem ao caso...) realmente preocupado com AS PESSOAS (e, totalmente off-topic, com senso de humor - olha a "foto" do perfil rsrs)



Depois de algumas horas de leitura e uma gripe que não me deixou dormir:

É realmente lamentável ver essas demonstrações de racismo e certo xenofobismo de alguns brasileiros. Nada justifica atitude de hostilidade que estamos vendo. Só comparáveis em estupidez àquela do manifestante pró-Cuba que não deixou a blogueira Anti-Castro falar numa entrevista aqui no Brasil
.

Mais lamentável ainda é ver como lidamos com algumas questões de modo superficial e injusto: com generalizações, palavras e expressões fortes que nada contribuem para o entendimento das questões. É muito difícil emitirmos uma opinião bem-informada a respeito de qualquer coisa, pois lidamos com fontes comprometidas partidária e ideologicamente, com interesse de classes e de grupos. Fui verificar as dados do governo para o programa Mais Médicos, tentar ver a atuação e a preocupação dos Conselhos de Medicina nesta questão e em outras no debate sobre saúde pública, também recorrendo às experiências pessoais de convívio e atendimento com bons e maus profissionais da medicina e tentar verificar como outras categorias de profissionais e ramos de atividades encaram "sair" de seus lugares e irem trabalhar em municípios distantes do Brasil. Seria apenas uma questão de dinheiro?

... tudo isso para tentar sair da solução mineira apresentada pelo personagem Raymundão qdo perguntado sobre a rivalidade de Silvinho e Badú de Guimarães Rosa na novela o Burrinho pedrês: "Eu cá não quero dar sentença, porque todos os dois tem razão e nenhum tem, também".
Eis alguns pontos: já fui acusado por médico experiente de querer atestado pra fugir do trabalho, que inicialmente foi incapaz de associar minha indisposição ao trabalho, sonolência inconstante e magreza incomum de menino de 14 anos que acabara de ingressar no mercado de trabalho à hipoglicemia (exame tão simples); já tive médico que nem olhou para minha cara e me atendeu em menos de 5 minutos depois de esperar numa fila por mais de 4h, nem sei se ele percebeu que eu falava português ou ouviu eu dizer meus sintomas. já fiz consulta com oftalmologista que foi incapaz de acertar o grau de meus óculos. Mas também fui atendido por bons profissionais, sempre na rede pública de saúde, lembro-me do ortopedista que me encaminhou para uma cirurgia pelo SUS que saiu em menos de 90 dias, depois me encaminhou pra 60 sessões de fisioterapia e resolveu um problema de luxação de ombro q me acompanhava por 10 anos!


Outro dia partilhei aqui o fato de muitos brasileiros atravessarem o Estado de Rondônia para procedimentos médicos na Bolívia, eles assumem o risco da estrada, dos ônibus e dos erros médicos (pois acho que não vão acionar a diplomacia brasileira para recorrer de um erro médico)... tudo isso parece ser mais seguro que o João Paulo II. Há também o caso do gestor público que vê no CAPS e na UTI móvel presentes de grego da união para os municípios que depois não conseguem contratar médicos para os manter. Outro caso: em dezembro de 2012, em viagem de Guajará-Mirim a Porto Velho, o ônibus, último de um domingo, em que estávamos colidiu com um carro e virou na ribanceira. No ônibus, três jovens médicos, recém formados. esqueceram de si, agiram rápido e, certamente, salvaram vidas (uma senhora infartada pelo menos). Quando fomos encaminhados para o primeiro posto médico em Jaciparaná, depois de encaminhar todos os pacientes, um deles disse: "isso é sinal! Devo parar com essa vida!", referindo-se às viagens precárias que constantemente fazia de PVH a municípios menores e a distritos para atender os diversos plantões. Então levantei para mim mesmo algumas questões.

Falta altruísmo aos médicos, são mercenários? E os Conselhos de Medicina estão apenas preocupados com a lei da oferta e da procura ao tentar barrar a entrada de médicos estrangeiros? Realmente faltam médicos? A média 1,8 médico por 1000hab é pequena? Formar 12 mil médicos por ano, com 16 mil vagas nas faculdades de medicina é pouco? Onde estão os cursos? Quem os cursa? Como outras categorias e ramos de atividade encaram irem trabalhar em municípios distantes? Quais são os meios do governo e empresas atraí-los?

Primeiramente: acredito que faltam médicos e emergencialmente justifica o programa Mais Médicos. Acredito também que o fato de os médicos não quererem sair de sua cidade e região não se deve apenas a questões financeiras: se pudermos estudar e trabalhar perto de nossa família e amigos, é claro q vamos preferir isso! Outros agentes do serviço público prestam concurso às cegas, sem saber pra onde, atraídos pela estabilidade e bons salários, aceitam ir pra onde for mandados, por 3 anos (tempo do probatório) e começa a luta pela transferência! Salários iniciais para auditor da receita, Juízes de direito, promotores de justiça... todos são maiores do que dos médicos. Há alguns médicos privilegiados que ganham 40 mil no SUS, mas trabalham 62h semanais e são horas extras, não salário (falta plano de carreira!) Só à guisa de provocação: perguntem aos bispos do sul e sudeste que querem manter o projeto de igrejas irmãs, enviando padres para regiões distante da Amazônia e interior do Nordeste como está o nível de "altruísmo" do clero. Médicos não mercenários. Alguns sim! Como os padres não pedófilos. Alguns sim. Cubanos e outros médicos que estudam bem menos em faculdades da Bolívia, Venezuela etc... não são mal preparados. Alguns sim. Nem todos os Médicos que estudam em instituições brasileiras são não bem preparados! Toda generalização é estúpida e preconceituosa.

Sobre a atuação dos Conselhos de Medicina no debate da saúde pública, indo além do interesse de classe. Se há, não acontece em nível de sociedade, nem mesmo com outros profissionais da saúde; talvez em nível de governo ou tribunais. Mas a verdade é que a grande parte da sociedade não vê legitimidade na atuação destes conselhos. E não são poucos os médicos que não se sentem representados por eles. Poucos médicos no mercado interessam à classe, poucos cursos também; além de garantir poucos médicos, dá a falsa impressão de alguém zela pela qualidade deles! Por isso é tão difícil para a sociedade agora acreditar que os entraves impostos para novos cursos, para convalidação de brasileiros que estudaram fora do Brasil e validação dos diplomas de estrangeiros sejam preocupação com qualidade dos médicos, repentino interesse pela saúde pública e não apenas interesse de classe.

Como ação emergencial, vejo como necessária a abertura para médicos estrangeiros (sem necessidade da convalidação dos cursos no Brasil), deverá ser mantida a abertura para médicos estrangeiros sempre, seguindo os devidos trâmites. Penso, porém, que o governo não tratou com justiça a questão de falta de médicos para os municípios distantes. Não há plano de carreira, os salários não são compensatórios e não há estratégia de atração (como para outras categorias). É claro que o programa Mais Médicos prevê investimentos em infraestrutura, equipamentos, abertura de novas vagas e especializações.

Como que os governos não conseguem evitar as greves nas universidades? Por que não se investe em faculdades de medicina nas fronteiras? Há muitos jovens querendo estudar medicina nos municípios amazônidas e do interior do Nordeste. Não é mais fácil levar educação básica e cursos de medicina de qualidade para estes jovens do que querer fazer migrar vários jovens para estas regiões?

O problema da saúde pública não é apenas falta de médicos, e o problema de falta de médicos não é apenas de falta de altruísmo da categoria. É problema de gestão, de planejamento, de programas que vão além de políticas de governo (refém de ideologias e grupos de interesse) para uma política de Estado. E para isso é necessário mais que o governo, é preciso toda a sociedade, inclusive os conselhos de medicina debatendo com toda a sociedade; é necessário que sociedade brasileira esteja disposta a muito mais que ir a ruas manifestar-se. Para usar uma metáfora recorrente, não basta o gigante acordar, também precisa saber aonde deve ir!

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