terça-feira, 20 de outubro de 2009

Uma coisa é uma coisa...

Alguns comentários sobre a crise do momento na Câmara Municipal (cassação, por decisão de primeira instância, do mandato de 13 vereadores):

1)O fato de um determinado setor fazer doações a candidatos não implica, necessariamente, em desonestidade. Nem o fato de o setor esperar ser representado por aquele parlamentar – todos têm direito de se fazer representar no Poder Legislativo. Se eu receber doações de militantes da cultura ou de ambientalistas, é porque se identificam comigo e esperam que eu defenda suas causas. Se um deputado recebe doações da indústria armamentícia, é porque reconhecem nele um defensor dos seus interesses. Eu sou CONTRA os interesses da indústria armamentícia, mas a doação para a campanha e tentativa de eleição de um representante seu não é ilegítimo.

2)Os maiores doadores de campanha são, quase sempre, bancos e grandes empreiteiras. Por que? Pra começar, porque tem muito dinheiro... E também porque querem, sim, manter bom relacionamento com as pessoas no poder (ou em vias de obtê-lo). Não querem criar caso/ ganhar inimigos entre potenciais prefeitos, governadores, presidentes, vereadores, deputados, senadores. Não fazem muita questão de ideologia – a fase do “medo do Lula”, por exemplo, passou faz tempo...
Querer manter bom relacionamento com os poderosos também não é, necessariamente, crime eleitoral... Pode não ser a coisa mais bonita do mundo, pode vir a ser fonte de constrangimentos futuros (“Eu te ajudei e agora você não quer me ajudar!”), mas não é crime.

3)Receber doação de campanha E defender os interesses de determinado setor que fez contribuições também não é crime. Crime é defender os interesses escusos; prejudicar os interesses da sociedade para beneficiar seus parceiros, quer eles tenham financiado a campanha eleitoral ou não.
Aliás, se a intenção de um parlamentar é atuar de maneira desonesta a favor deste ou daquele setor, é muito melhor não receber doações dele durante a campanha – e fazer todos os “negócios” depois.

4) A prestação de contas da campanha eleitoral é uma coisa barroca, absurdamente detalhada e complexa. Se você pensa que é chato e complicado fazer a declaração para o imposto de renda, não viu nada ainda.
Claro que alguém pode fazer a declaração de qualquer jeito e dizer “que se dane, quero ver me pegarem, nunca pegam ninguém”. Mas para cometer alguma desonestidade, é MUITO mais fácil fazer tudo por fora, sem pegar recibo algum... Passar o recibo já é chato quando você faz tudo direitinho, então para que se dar ao trabalho?

5)Além de tudo, não é o candidato quem cuida pessoalmente das contas de campanha. Ainda que seu coordenador de finanças tenha aceitado fazer as coisas meio de qualquer jeito, é perfeitamente possível que ele não saiba.
Essa cassação em bloco acaba botando todo mundo em um mesmo balaio, quem sabe de tudo e quem não sabe, quem gosta de fazer tudo direito e quem não faz questão...

6) É tão ruim demonizar doadores de campanha e candidatos que recebem doações que acaba afugentando quem quer fazer as coisas direito. Na minha candidatura a deputada, algumas pessoas me procuraram querendo contribuir “por fora” por uma única razão: não queriam aparecer e ficar sob suspeita de “interesses ilícitos” (ainda mais naquele período de antipetismo galopante). Demagogia e maniqueísmo são coisas que fazem mal à compreensão do sistema eleitoral e à justiça – é muito fácil dizer “recebeu dinheiro de empreiteira? Ladrão!” e, enquanto isso, deixar de perceber mil desonestidades grosseiras ou sutis, que não deixam recibo.

15 comentários:

  1. Dentro do atual sistema, entendo que você está corretíssima.
    Mas será que esse é o melhor sistema eleitoral?
    Será que não estamos respondendo as perguntas erradas?

    Eu atacaria a raiz da questão e não suas manifestações...

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  3. Soninha, mas o que falam na matéria da Folha é que o Sindicato do setor, que pela lei não poderia contribuir, fez a doação através da AIB (pelo que entendi). Qual seria o problema então? Argumentos para a cassação existem... A contribuição deveria ser permitida? Mas como vc disse, maniqueísmo e demagogia realmente existem, e realmente nublam a visão dentro da política... tanto no sistema eleitoral, como no próprio dia-a-dia.
    Acompanho seu trabalho desde seu primeito mandato como vereadora, e mais ainda agora com vc sendo subprefeita, e na Lapa, bem perto de onde eu morava em Sampa. Boa sorte, ânimo e força! []'s!

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  5. Nenhuma doação seria problema se fosse feita a um candidato apenas e ou a seu partido/coligação.
    A mesma entidade doando aos dois lados de uma disputa majoritária, por exemplo, não faz sentido. Quanto ao candidato não saber ou não ter como saber quem doou quanto....isso não dá mesmo. Tem que saber tem que conferir, pelo menos das grandes doações... Em um pro médio é possível destacá-las.O barroco do sistema de conferencia do tribunal pode ser simplificado ou então como saber se a indústria de armas não foi uma doadora de campanha?
    Não posso concordar com qualquer tipo de falta de transparência, assim como o de uma vereadora que em declaração à justiça afirmou não ter bens em seu nome, mas fez um aporte próprio, de mais de R$ 40 mil ...
    E finalmente, defender os interesses não escusos de um determinado setor, não é problema se este vier a reboque do único objeto de qualquer político, o cidadão, provado e comprovado.
    A transparência nem seria só publicar o ato de governo, mas ainda explicar como e porque tudo seria feito, Soninha. Esse é o jeito diferente de fazer política, com o qual uma candidata me convenceu a mudar o meu voto. A minha mudança vai permanecer.

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  6. Creio que quem foi eleito pelo voto popular tem o DEVER de defender os direitos dos seus eleitores e não dos que colaboraram com sua campanha. Quem doa dinheiro para campanhas, seja de quem for, deve ter a dignidade e a ética de esquecer que o fez.
    Esse lance de que uma mão lava a outra e as duas enchem os bolsos, deve acabar.

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  7. Essa é uma ótima discussão, principalmente pra quem pensa que instaurar uma social democracia no Brasil é possível (bom, pelo menos tá na sigla!) Achei um video que fala um pouquinho sobre os lobbies - imagino que seja o mecanismo para tal "controle social" proposto pelo partido em questão - num local onde eles supostamente funcionam, regulamentados: www.youtube.com/watch?v=pg7xhTyOtAk). Lembrei imediatamente dos comentários no blog antigo, em que dizia-se que "as votações aconteciam nos bastidores", o que era "decepcionante"...

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  9. Aprecio muito a sobriedade dos seus comentários.

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  10. Isso que você está abordando nesse post vai muito além de eleições. Isso é uma tendência em todos os seguimentos da sociedade brasileira. As regras são intencionalmente complexas a tal ponto que ninguém conseguer cumprir e assim, todos se tornam errados perante a lei e se veem obrigados a pegar atalhos e, dessa maneira, os verdadeiros bandidos passam desapercebidos nesse cipoal todo.

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  11. Soninha querida, nesse caso, para nós cidadãos nada do aspecto formal da instancia, ou se é legal ou legítimo importa. A UNICA caoisa que importa é que alguns desses vereadores estão tomando conta do galinheiro liderando o processo de revisão do PDE e NUNCA deixaram claro que foram (alguns substancialmente) financiados por entidades ligadas ao negócio imobiliário. Estamos falando de transparencia e honestidade, materias raras na Camara.

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  12. Uma coisa é uma empresa apoiar esse ou aquele deputado. outra coisa é fazer doações um grupo de deputados de vários partidos. O resultado disso são as alterações do zoneamento da cidade. Ao sobrevoar a cidade dá para ver que ela só foi construída assim devido à muita corrupção.
    Isso é inaceitável.
    Como vc mesmo disse uma coisa é uma coisa, outra...

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  13. olha só o que o partidozinho da subprefeitinha demo-tucana carguista e sem-caráter está pregando contra a Dilma...até imagino que depois ela vai escrever aqui que não sabia de nada, como fez quando Jungman foi a tv dizer que haveria o confisco da poupança pelo governo federal...

    SITE DO PPS

    TÍTULO: VOTE EM DILMA E ELEJA CHÁVEZ
    http://tv.pps.org.br/tv/showData/160713

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  14. Soninha, permita repassar um recadinho: Freire, papai adorou a parte da entrevista no Roda Viva em que você “se meteu com aqueles que ninguém nunca fala”, referindo-se aos que assinaram o golpe militar.
    De minha parte: as explicações sobre os Conselhos me convenceram.

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  15. Soninha, suas análises sobre doações para campanhas procedem, e vão fundo nos vários aspectos da questão, que, como você demonstra, não se deve limitar a condenar todos que recebem, e nem inocentar os que não recebem (oficialmente).
    O problema é que indo mais fundo ainda, a gente se depara com a seguinte lógica: por que raios uma empreiteira, imobiliária, banco (só para citar os mais "ativos") iria fazer polpudas doações, se não tivesse como recuperar seus "investimentos"?

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