terça-feira, 18 de maio de 2010

Virada

Comecei a noite pela Luz. Ano passado, o Parque da Luz tinha instalações e apresentações lindas; este ano, as principais atrações estavam do lado de fora. Fomos recebidas (eu, filha, amigas da filha) por uma orquestra quando saímos da estação de trem... Palco enorme, multidão entusiasmada, um bom começo.
Demos um tempo ali e fomos à Pinacoteca. Também adorei passear pelas exposições em pleno sábado à noite... Aliás, me dei conta de que ainda não tinha visitado os andares superiores desde a famosa reforma, alguns anos atrás.

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Eu queria ter saído no Trem das Onze, que ia em direção ao Brás ao som de Adoniran Barbosa, mas as meninas não estavam com muita paciência para entrar na fila. Caminhamos, então, até a República – desta vez, a av. Cásper Líbero, que no ano passado estava intransitável com as multidões que foram ver homenagens a Raul Seixas, tinha espaço para andar. Ouvimos uma banda de rock (muito boa) e os primeiros malucos apareceram.

Um grupo de moleques de 16 ou 17 anos, quimicamente alterados (só um pouco mais alegres e extrovertidos do que seria o “normal”), anunciava pacotes de biscoito de polvilho – “2 por R$1,50!” Não foram lá para ganhar dinheiro, só queriam um trocado para ajudar na balada.

Depois que comprei um pacote, um deles gritou: “Não! Peraí! Você é cantora?” Começaram a fazer a maior algazarra. “É!” “Não é!”. Disse “não sou – sei que eu pareço muito com uma cantora, a Fernanda Takai, do Pato Fu”. Começaram a repetir Takai-Pato-Fu como se fosse um trava-línguas, até que um anunciou em altos brados: “Altas Horas do Serginho Groisman!”

Consegui perguntar para um deles: “E se eu fosse cantora?”. “Ah, a gente não ia poder cobrar o biscoito de você”.

Depois fiquei imaginando o que teria acontecido se eu tivesse dito: “Não, sou política”.

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Passamos no palco da Santa Efigênia, onde estavam tocando Reggae Dub, e seguimos pela São João, seguindo as sugestões dos totens de informação, bem colocados em várias esquinas. Pensamos em ficar um pouco na República, mas acabamos indo em direção ao Anhangabaú. Do Viaduto do Chá, vimos um balão e bonecos gigantes, mas seguimos para a frente do prédio da prefeitura.

Um campo de futebol vertical aguardava uma apresentação do Acrobático Fratelli, marcada para as 23:30 (ou era 00:30? Não lembro). Não tinha nem sinal de começar, então fomos dar uma espiada no palco dance da São Francisco.

Na volta, mais um encontro inusitado: um garoto, de uma turma de três (esses, sóbrios), pediu para tirar uma foto comigo. Ele quer ser jornalista e trabalhar na ESPN; o outro, na MTV. O terceiro... quer ser mecânico de aviões :o).

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Ano passado, naquele mesmo lugar (Líbero Badaró X Rua do Ouvidor), havia um grupo animadíssimo, pulando, tocando tambor e distribuindo abraços de cortesia. Chegando mais perto, entendemos o que diziam: “Ah! Jesus te a-ma! Ah! Jesus te a-ma!”

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Já tinha passado muito da hora marcada e nada de começar o espetáculo. Encontrei amigos e esperamos juntos. Um deles convidou outro amigo por telefone: “Vem, vai ter uma apresentação de circo”. O amigo: “O Palmeiras vai jogar aí?”. E eram palmeirenses, os dois. #quefaaaaaaaase

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Para não ficarmos parados esperando, fomos ver suspensão – gente pendurada por ganchos espetados na pele – na Galeria Prestes Maia.

Adivinhe? É chocante. Fiquei com pavor de os ganchos rasgarem a pele e o rapaz cair no chão.

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De volta à rua, ainda demorou bastante até começar o bendito jogo. Uma galera começou a pular abraçada, como se fosse uma almôndega, cantando o Hino Nacional. Direitinho, sem vacilar nem no “Brasil de amor eterno seja símbolo/ o lábaro que ostentas estrelado”.

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Finalmente, uma acrobata atravessou o Vale do Anhangabaú pendurada a um cabo de aço a uma altura impressionante.  Depois a trupe desceu do alto do prédio da prefeitura e logo começou o jogo.

Mas já estávamos exaustos, depois de muito caminhar e muito ficar em pé. Para o ano que vem, quero lembrar de levar banquetas ou papelão para sentar no chão, nem sempre limpo... Vi dois caminhões lotados de sacos de lixo recém-recolhido no começo da madrugada; não sei se era operação cotidiana ou especial para a virada. Mas não tem jeito, as pessoas jogam copos, papéis, espigas de milho no chão com a maior naturalidade. Sem falar no xixi... Mesmo que haja dois milhões de banheiros químicos, tem muita gente (gente com cromossomos XY) que não faz a menor questão de mijar no lugar certo.

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Meus amigos resolveram encarar uma ida ao Arouche tentar pegar o show do Sidney Magal. Soube que estava LOTADO.

Perdi muita coisa boa, mas arreguei. Fiquei com vontade de me programar melhor no ano que vem – desta vez, saí sem projeto, e andei mais do que vi, ouvi, dancei. Também fiquei imaginando uma imensa praça de alimentação no Viaduto do Chá, pra gente comer, sentar, curtir. (As barracas de pastel tinham filas imensas, mas vários bares e lanchonetes estavam funcionando. O problema não era falta de lugar para comer, mas eu queria mesmo algo mais no clima da Virada – ao ar livre, no meio da rua...). Também quis poder contar com táxi-bike...

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Na volta, um menino de uns 17 anos cutucou uma das amigas da minha filha, forgado que só. Ela nem se abalou, mas eu saí atrás dele mostrando o dedo médio. O amigo se incomodou por ele: “Desculpe. Mas... Você é a Soninha?”. Aí o outro, bêbado que só, parou: “Soninha? Ô, desculpe aí”. “Não é pra mim, pede desculpa pra ela”. Aí ele se tocou: “Desculpe... Ô, nem vi que era de menor , foi mal aí. Eu to bêbado, mas eu tenho noção, viu?” – falou, com a voz mais enrolada do mundo.

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Já eram quase duas horas da manhã e o metrô chegou à estação Anhangabaú, vindo da Zona Leste, LOTADO. Desceu quase todo mundo na República, e aí deu pra ver uma imensa mancha de vômito no chão do vagão.

O tempo passa, e a molecada continua achando que se divertir à  noite = beber até passar mal. Multiplique “molecada” por milhões, acrescente alguns milhares de adultos com idéia semelhante, e teremos quase um milagre de convivência.

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De tudo o que perdi (Living Colour, por exemplo), o que mais lamento foi não ter esperado um pouco para embarcar no trem do Adoniran... Deve ter sido divertido. Mas acho que a CPTM vai ter cada vez mais música nos trens e estações (aliás, o Piano da Luz estava lá, sempre à disposição de quem quiser tocar. Devia haver vários desses!)

Terminei a Virada onde não imaginava – no sofá de casa, assistindo transmissão ao vivo da TV Cultura. Ano que vem me preparo melhor na véspera (isto é, durmo) – mais do que qualquer show, andar de madrugada pela cidade fervilhando de gente é muito legal. 

Um comentário:

  1. Dessas coisas que fazem a gente gostar ainda mais de São Paulo...

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