A manobra é antiga, mas o governo Lula/Dilma elevou a prática a novos patamares.
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Lembro, nos anos 80, da desconfiança/ceticismo que acompanhava cada anúncio da inflação. Os números apresentados pelo governo sempre pareciam menores do que os da experiência cotidiana (e do que os estimados por especialistas independentes ou da oposição).
Lembro, nos anos 80, da desconfiança/ceticismo que acompanhava cada anúncio da inflação. Os números apresentados pelo governo sempre pareciam menores do que os da experiência cotidiana (e do que os estimados por especialistas independentes ou da oposição).
Meu amigo Laerte Mello “explicou” pra gente, na época (84), como funcionava: “O governo escolhe uma cesta de produtos para medir as variações de preço. Aí vê que o arroz e feijão estão 30% mais caros, mas a tintura para bigodes teve uma redução de 200%, então faz a média e publica”.
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O governo Lula/Dilma forneceu bastante material para meu futuro livro, o “Manual da Desonestidade”.
O governo Lula/Dilma forneceu bastante material para meu futuro livro, o “Manual da Desonestidade”.
- Juntou programas que já existiam em um só e diz que inventou o Bolsa Família - e contra a vontade dos malvados da oposição, que não gostam de pobre, muito menos de nordestino.
- Dividiu universidades que já existiam em duas, renomeando um campus, por exemplo, e diz que “criou universidades” – ao contrário dos malvados da oposição, que não querem que pobre faça faculdade.
- Criou meia dúzia de salas de aula, instaladas em um prédio emprestado, sem os mínimos recursos necessários (laboratórios, bibliotecas, professores...) e diz que “criou e interiorizou universidades”, ao contrário dos antecessores cruéis etc.
- Diz que “bilhões serão investidos” em tal e qual programa, e de fato está lá o número no orçamento. Depois não gasta nada daquilo mas, como diria o personagem de humorístico, “já fez o seu comercial”.
- Assina o contrato para a construção de “10 mil casas”, que ficarão prontas daqui a meses ou anos, e anuncia a “entrega” de 10 mil casas...
- Junta em um número só imóveis de alto padrão e casas populares e diz que o programa (claro que estou falando do Minha Casa, Minha Vida) atendeu aquilo tudo de “pobres”.
- Anunciou uma meta de redução de emissão de GEE (Gases de Efeito Estufa) “maior que a de São Paulo!” – mas não explicou que o ponto de partida para o cálculo da redução foi um número completamente desatualizado.
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Enfim, existem muitas maneiras de torturar os números.
- Dividiu universidades que já existiam em duas, renomeando um campus, por exemplo, e diz que “criou universidades” – ao contrário dos malvados da oposição, que não querem que pobre faça faculdade.
- Criou meia dúzia de salas de aula, instaladas em um prédio emprestado, sem os mínimos recursos necessários (laboratórios, bibliotecas, professores...) e diz que “criou e interiorizou universidades”, ao contrário dos antecessores cruéis etc.
- Diz que “bilhões serão investidos” em tal e qual programa, e de fato está lá o número no orçamento. Depois não gasta nada daquilo mas, como diria o personagem de humorístico, “já fez o seu comercial”.
- Assina o contrato para a construção de “10 mil casas”, que ficarão prontas daqui a meses ou anos, e anuncia a “entrega” de 10 mil casas...
- Junta em um número só imóveis de alto padrão e casas populares e diz que o programa (claro que estou falando do Minha Casa, Minha Vida) atendeu aquilo tudo de “pobres”.
- Anunciou uma meta de redução de emissão de GEE (Gases de Efeito Estufa) “maior que a de São Paulo!” – mas não explicou que o ponto de partida para o cálculo da redução foi um número completamente desatualizado.
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Enfim, existem muitas maneiras de torturar os números.
- A “média” é a maneira universalmente aceita... A metáfora clássica para explicar o “defeito” da média é a da “cabeça no forno, pé na geladeira – temperatura média ok”, mas o sujeito está morto.
- Também é possível escolher os limites geográficos da amostragem. Você analisa famílias na Pampulha mas não em Jequitinhonha e diz: “Olhem, aumentou a renda em Minas!”.
- Outra maneira interessante é definir o período da análise conforme a conveniência. Você pode decidir se compara os números de hoje com os da semana passada, do mês passado, do mesmo mês no ano passado, da última década... E pior, depois compara períodos diferentes.
- Também é possível escolher os limites geográficos da amostragem. Você analisa famílias na Pampulha mas não em Jequitinhonha e diz: “Olhem, aumentou a renda em Minas!”.
- Outra maneira interessante é definir o período da análise conforme a conveniência. Você pode decidir se compara os números de hoje com os da semana passada, do mês passado, do mesmo mês no ano passado, da última década... E pior, depois compara períodos diferentes.
- Fazer um retrato, congelar aquele momento e dizer: “Olha, está sol!”. Geou antes e depois, passou um furacão, choveu e alagou, mas você divulga a foto ensolarada para o mundo inteiro e pronto.
- Se não der para mudar os números em si, sempre se podem alterar os critérios: se antes você dizia que pobre é quem tem menos de R$100 por mês, por exemplo, começa a dizer que pobre é quem tem menos de R$70. Tchã-nã! Sai um monte de gente da pobreza.
- Também pode desencanar do câmbio... Usar o dólar como medida de comparação entre dois ou mais períodos, como se o valor dele em relação à nossa moeda não tivesse variado tremendamente.
- Uma pessoa é encontrada morta com 20 facadas nas costas. Em vez de classificar como homicídio, você pode escolher “agressão seguida de morte” ou “causa a apurar”. Depois diz que “caíram os homicídios”.
O céu é o limite! Até porque o céu também não tem medidas.- Se não der para mudar os números em si, sempre se podem alterar os critérios: se antes você dizia que pobre é quem tem menos de R$100 por mês, por exemplo, começa a dizer que pobre é quem tem menos de R$70. Tchã-nã! Sai um monte de gente da pobreza.
- Também pode desencanar do câmbio... Usar o dólar como medida de comparação entre dois ou mais períodos, como se o valor dele em relação à nossa moeda não tivesse variado tremendamente.
- Uma pessoa é encontrada morta com 20 facadas nas costas. Em vez de classificar como homicídio, você pode escolher “agressão seguida de morte” ou “causa a apurar”. Depois diz que “caíram os homicídios”.
(Continua abaixo)
Tô curioso, Soninha, pra ler o seu comentário sobre a "Privataria Tucana" e tentar achar nela uma possível "tortura nos números". Mais curioso ainda seria descobrir onde foi parar a antiga Soninha.
ResponderExcluirMe dá uma imensa tristeza esse seu discurso tucano-paulista. Pule fora dessa barca furada, Soninha, ainda é tempo!
ResponderExcluirFaço minhas as palavras do leitor Gê Cesar, tenho curiosidade em saber sua opinião sobre os fatos contidos no livro 'a privataria tucana'.