sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Destros e canhotos

"Como saber quem é esquerda e direita no Brasil"? - a pergunta que quer calar, porque essa conversa é um saco na maioria das vezes, mas fazer o que se ninguém responde direito?

A escola não ensina, aí as crianças aprendem coisa feia na rua.

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A discussão sobre esquerda e direita NUNCA é séria. Me lembra os "debates" entre políticos na tribuna da Câmara Municipal, "super" preocupados com a epidemia de dengue: "O número de casos aumentou em São Paulo. O senhor José Serra tem de responder por isso". "O Brasil vive uma epidemia de dengue. Esse é o governo do PT". Como cazz fazer para realmente impedir a proliferação do mosquito, ah, isso não é problema do Legislativo, o governo que se vire.

Mas o debate tosco tem uma vantagem: se alguém diz que odeia esquerda, esquerdistas, esquerdóides, esquerdalha, sanguessugas do Estado, vagabundos etc, esse alguém se considera de direta. Se acusa seus oponentes de serem da direita reacionária, elite perversa, conservadores, neoliberais, privatistas, pensa que é de esquerda.

Um "se considera", o outro "pensa" e vice-versa.

Porque os que "odeiam a esquerda" tem ideias que NÃO COADUNAM com o pensamento liberal/neoliberal; os que "odeiam a direita" idem.

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Exemplo 1:

No Brasil, quem acha que quanto menos Estado melhor; que o livre mercado e a competição são a garantia de que haja justiça e desenvolvimento; que o lucro tem função social e é o combustível para o progresso, que quem é rico merece ser porque foi competente etc... É contra a legalização da maconha. Acha que isso é coisa dos retardados lá da USP.

Ou seja: quer que o Estado continue determinando que essa é uma substância que tem de ser mantida na ilegalidade porque faz mal. Não admite nenhum tipo de liberdade, autonomia, discernimento. Adultos, jovens, adolescentes e crianças, sob o ponto de vista do uso de maconha, são considerados pelo Estado igualmente incapazes de tomar decisões e cuidarem de si. "É proibido; queremos protegê-los".

Um VERDADEIRO neoliberal quer o Estado fora disso. Tanto é que a revista Economist defendeu a legalização em manchete de capa. Confia mais no mercado livre, no empreendedor, na organização da atividade industrial e comercial privada do que no governo pra "cuidar" disso (porque na prática quem "cuida" é o crime organizado; o governo diz que "é proibido" e fracassa retumbantemente em proteger as pessoas - da substância, dos vendedores, dos que supostamente reprimem a venda).

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Exemplo 2:

O governo Lula/Dilma e seus aliados juram por Deus que esse é um governo de esquerda, que promoveu inclusão social e profundas transformações no seio da sociedade como nunca dantes. Os pobres agora são Classe C e a classe média é a salvação da lavoura. Melhor: da indústria automobilística.

Claro, uma das medidas de que Lula mais se vangloriava e que Dilma levou adiante foi a facilidade oferecida para que os pobres possam ter seu carro zero. Primeiro, o crédito foi estendido para "mil" prestações. Depois veio o festejado IPI Zero. Inclusive para Hilux não sei que, Mitusbishi não sei qual - longe, loooonge da Classe Média Alta, quando mais da Baixa (a Secretaria de Assuntos Estratégicos define que famílias com  renda per capita de mais de R$281 já se enquadram nessa categoria. É um pouco mais de R$9,00 por dia).

Vamos analisar essa política sob a ótica marxista mais elementar:

1) O governo quer garantir uma propriedade privada para cada pessoa. O transporte coletivo público tem MUITO mais a ver com o ideal do comunismo do que isso.

2) O governo quer garantir os empregos na indústria automobilística - exemplo clássico de exploração da força de trabalho, mais-valia, patrões e empregados. Nada de propriedade dos meios de produção pelos trabalhadores. É empresa privada voltada para o lucro, com zero consideração pela coletividade. Seu negócio é botar carro no mundo.

3) O governo renunciou a impostos para fomentar a aquisição de propriedade privada (carros) para tentar ajudar a sustentar uma indústria voltada para a obtenção de lucro. Sem se preocupar com a educação financeira da população, que não sabe calcular o custo final do bem x sua desvalorização gradual; seu endividamento x sua perspectiva de renda; o custo de manutenção dessa propriedade. E, principalmente, sacrificando os municípios menores, muito dependentes do Fundo de Participação de Municípios - política redistributiva, por meio da qual a União arrecada ("sangra") dos estados mais ricos e transfere (migalhas) para os pobres.

O governo federal sacrificou impostos, debilitou ainda mais sua capacidade de redistribuição, empobreceu ainda mais municípios pobres, para incentivar a compra de automóveis.

Portanto: a poeira de Marx se revira no túmulo com essa "revolução social".

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Há muito mais exemplos de "estatismo" de quem se considera anti-esquerda e de "privatismo" de quem se considera anti-neoliberal.

E ainda falta falar da ideia de que a esquerda é progressista e a direita é conservadora. No próximo capítulo.

Um comentário:

  1. Soninha,me desculpe,mas,vc nao ia falar de esquerda e direita?Esperava algo mais direto,contudo,vc desviou.Esperava mais!

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